quinta-feira, 20 de maio de 2010

A sociedade e o conflito

Um dos traços marcantes dos seres humanos é o fato de que vive em constante conflito: consigo por algo que fez ou deixou de fazer, por não ser melhor ou por perder oportunidades; conflito com os outros porque não consegue compreender suas ideias ou o que está sendo dito; conflito com a natureza, dado a inclinação para querer domesticar tudo ao seu redor.

O conflito é um fato concreto, real, inerente a espécie humana e de grande importância. A vida em sociedade gera inevitavelmente o conflito. Onde duas ou três pessoas estiverem reunidas, conversando sobre assuntos banais ou de grande relevância, instalar-se-á o conflito. A razão disso reside na capacidade inata de gerarmos ideias e pensamentos distintos dos demais. É uma marca implícita da condição humana.

Muitos entendem que para se viver em sociedade de forma harmônica e em paz é necessário que não haja o conflito. Contudo, esse elemento é vital, essencial e indispensável para a sociedade. A discordância de ideias possibilitou, possibilita e possibilitará que avancemos nas descobertas científicas, nos valores políticos, éticos, morais e estéticos, no desenvolvimento e aperfeiçoamento do espaço geográfico, nas soluções de problemas em comum. O conflito estimula a inteligência. A questão, portanto, não é a ausência do conflito para que possamos viver em uma sociedade unida, harmônica e em paz. O que se faz necessário é aprender a lidar com conflito, buscar nele motivo para superação. Falta para a sociedade a capacidade de dialogar - cuja ausência é muito mais grave.

Fomos educados para entender os momentos de conflito como desagradáveis, indigestos, desnecessários e improdutivos. Aprendemos a mascarar as situações: dizer sim quando deveríamos dizer não, sorrir quando queríamos chorar, aplaudir quando queríamos esbravejar, calar quando queríamos fociferar a plenos pulmões as nossas razões. Nessa sequência, procuramos evitar a todo custo o conflito para não nos sentirmos feridos ou ferir. Sempre que isso nos acontece, perdemos a oportunidade de aprender a gerenciar um momento que é rico de oportunidades: para o aprendizado do diálogo, para o exercício da tolerância, a prática da análise e argumentação, a defesa de posicionamento a partir de ideias, o treino da escuta sensível que torna capaz utilizar as palavras certas para abrir portas e conquistar corações e mentes... e assim, uma série de benfeitorias possíveis de acontecer.

Uma sociedade harmônica não é uma sociedade sem conflitos. Antes, é a expressão de uma sociedade que aprendeu a dialogar a partir dos seus conflitos, aproveitando para ressaltar o melhor e mais útil. Uma sociedade harmônica é aquela que não foge das controvérsias inevitáveis advindas de uma complexidade formada por indivíduos dotados de inteligência e particularidades, mas potencializa aspectos relevantes que tornam salutar a discussão, o debate, a argumentação, a paixão e os sentimentos. A paz tão buscada não irá surgir da ausência de conflitos, mas da capacidade de gerenciá-los.

Portanto, cabe educarmo-nos para vivermos autenticamente em grupo, com todas as situações oriundas dessa condição, não negando a nossa natureza conflitante, posto que isso só ocorre devido ao uso de nosso maior dom: a inteligência. Usemos, então, de inteligência para resolver os enigmas que outras inteligências criam em nosso dia-a-dia sem precisar incorporar o Massaranduba (aquele do Casseta & Planeta).
Edmario Nascimento da Silva

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